
Génesis Capítulo 6
A CORRUPÇÃO DO GÉNERO HUMANO PRIMITIVO
O pastor Byron Harbin neste estudo sobre a corrupção do género humano primitivo mostra os efeitos do pecado como acto de desobediência praticado originalmente por Adão e Eva (Génesis 3), tornou-se imediatamente em pecado como estado, que quer dizer, condição de existência tanto social como espiritual. Neste estudo apresentado ele dividiu o capítulo 6 de Génesis em secções, e, trata cada uma delas com um resumo do seu conteúdo. O pastor Byron Harbin aplica esse estudo também aos ensinos do Movimento Novo Nascimento.
1 - A corrupção do homem primitivo - Génesis 6.
Segundo muitos estudiosos este trecho é dificílimo, devido o que levou a raça humana a este estado de perversidade. Poderiam ter sido os casamentos mistos, entre os piedosos e os ímpios, ou na base do texto hebraico, casamentos entre anjos caídos e mulheres humanas. O factor principal aqui, é que a humanidade chegou a ultrapassar os limites fixados por Deus, ao ponto de Deus fixar a idade em 120 anos. Têm surgido, algumas correntes de interpretação desse trecho, todas elas a focalizar principalmente a expressão Os filhos de Deus.
a) Esta interpretação parte desde Agostinho, de que Os filhos de Deus se refira às mulheres impiedosas da linhagem de Caim, tem base duvidosa. Por exemplo, por que o autor chamaria os descendentes de Sete de os filhos de Deus? A expressão encontra-se em outros lugares, e nunca leva o sentido de homens designados filhos de Deus. A interpretação, por outro lado, tem apoio no juízo de pais posteriores da igreja como Crisóstomo, Jerónimo, ao serem eles seguidos por Lutero, Calvino e outros.
O versículo de Génesis 6:3 traz três problemas interpretativos.
1)O Espírito de Deus não contenderá para sempre com o homem, no sentido do texto hebraico. A Septuaginta, porém, leu o texto como, não permanecerá para sempre no homem.
2) como entender o meu Espírito? Deve-se entender à luz do texto básico no Antigo Testamento em relação ao homem.
3) o sentido da palavra carne, na frase portanto ele é carne. É bem duvidoso que ela leve o sentido de carne pecaminosa.
O versículo de Génesis 6:4 nos informa da presença na terra àquela altura dos nefilins, ou seja os gigantes. A palavra nefilins parece vir de uma raiz que significa cair, a qual possivelmente daria para o substantivo o sentido de decaídos ou de caídos. Porém, a verdade é que ninguém sabe realmente.
Estes versículos trazem uma reflexão sobre a extensão do pecado na vida do homem primitivo. A decisão tomada de destruir o homem não veio, portanto, de um coração vingativo. Noé é indicado como homem que achou favor aos olhos de Deus, ele constava de uma excepção em comparação com os outros.
Em Génesis 6:6 indica o sofrimento de Deus por causa da perversidade que a humanidade tinha atingido. Por outro lado o coração de Deus em reacção com tristeza ou remorso por haver feito o homem. A tradução arrependeu-se o Senhor, não leva nada de mudança de propósito. A palavra no original dá a idéia de dor sentida por Deus por causa das circunstâncias da raça.
Em Génesis 6:7 mostra um contraste entre criar e o resultado em destruir. Em Génesis 6:8 forma também um contraste com a destruição anunciada no versículo 7, com a graça de Deus que Noé achou é, a essa altura, a simples bondade de Deus a favor de Noé.
Estas passagens constam um novo início, frisa-se Noé e, em seguida os três filhos que gerou. As qualidades morais e religiosas dele são resumidas para, logo em seguida, resumir as qualidades dos outros da sua geração. Em Génesis 6:9 mostra resumidamente que Noé, era justo e perfeito nas suas gerações, e andava com Deus. A sequência das palavras no original indica um destaque da parte do autor pelo qual ele quis frisar Noé como diferente dos seus contemporâneos.
Em Génesis 6:10 indica que Noé gerou três filhos (Sem, Cão e Jafé), eles receberão mais destaques, pois participaram do plano divino para salvar um remanescente e começar de novo. Em Génesis 6:11-12 mostra a corrupção universal daquela geração, e isso da perspectiva de Deus. O autor nos prepara para a destruição do povo, como descrita nos versículos posteriores. Assim, Deus viu aquela geração corrompida moralmente podre e estragada.
Em Génesis 6:13 relata como Deus antes de cumprir a sua decisão judicial, anunciou a Noé, que andava com ele. Repete-se que a característica principal da corrupção é a violência dos homens. Deus tinha anunciado a Noé o seu plano para trazer sobre a terra dos homens corrompidos uma destruição fulminante, agora ele revela os seus planos pela preservação de Noé, ao começar por indicar a arca como o meio dessa preservação.
Em Génesis 6:22 mostra a reacção de Noé perante o anúncio da destruição e as exigências de Deus a respeito. Assim fez Noé, segundo tudo o que Deus lhe manou. Foi por essa razão que o autor de Hebreus declarou: "Pela fé Noé, divinamente avisado das coisas que ainda não se viam, sendo temente a Deus, preparou uma arca para o salvamento da sua família, e por esta fé condenou o mundo, e tornou-se herdeiro da justiça que é segundo a fé" (Hebreus 11:7).
E ao finalizar o pastor Byron Harbin diz que o movimento novo nascimento não tem base firme na bíblia e não seguem regras de interpretação da bíblia.
Génesis 6 - A corrupção do género humano
Após a morte de Abel, filho de Adão e Eva assassinado pelo seu irmão Caim, a Bíblia conta que o casal voltou a gerar uma criança. Eva deu à luz a Sete, que trouxe na sua genealogia grandes homens de Deus, como Noé, Abraão e Davi, ao culminar no nascimento do Senhor Jesus Cristo, o Filho do Deus Vivo (Lucas 3:38). Caim também gerou filhos e filhas, que povoaram a Terra.
Entretanto, as Escrituras relatam que a Terra se encheu de violência, maldade e concupiscência carnal, com o pecado a manifestar-se abertamente no ser humano. Nos dias actuais, a degeneração humana não mudou; o mal continua a irromper desenfreado através da depravação, da imoralidade, da incredulidade, da pornografia e da violência, que dominam a sociedade inteira.
"A ira de Deus se revela do céu contra toda a impiedade e perversão dos homens que detém a verdade pela injustiça [...] Tais homens são, por isso, indesculpáveis; porquanto, tendo o conhecimento de Deus, não o glorificam como Deus [...] cheios de toda a injustiça, malícia, avareza e maldade; possuídos de inveja, homicídio, contenda, dolo e malignidade; sendo difamadores, caluniadores, aborrecidos de Deus, insolentes, soberbos, presunçosos, inventores de males, desobedientes aos pais, insensatos, pérfidos, sem afeição natural e sem misericórdia. Ora, conhecendo eles que são passíveis de morte os que tais coisas praticam, não somente as fazem, mas também aprovam os que assim procedem" Romanos 2:18-32.
Deus se revela já nestes primeiros capítulos da Bíblia como um Deus pessoal para com o ser humano, e que é passível de sentir emoção, desagrado e reacção contra o pecado deliberado e a rebelião da humanidade. Por causa do trágico pecado, Deus muda a Sua disposição em relação às pessoas; a Sua atitude de misericórdia e longanimidade passou à atitude de juízo.
A existência de Deus, o Seu carácter e os Seus eternos propósitos traçados permanecem imutáveis, porém Ele pode alterar o Seu tratamento para com o homem, ao depender da conduta deste. Deus altera sim, os seus sentimentos, atitudes, actos e intenções, conforme as pessoas agem diante da Sua vontade.
"Toda boa dádiva e todo o dom perfeito são lá do alto, descendo do Pai das luzes, em quem não pode existir variação ou sombra de mudança" Tiago 1:17.
"Eis que todas as almas são minhas; como a alma do pai, também a alma do filho é minha; a alma que pecar, essa morrerá.[...] Mas se o perverso se converter de todos os pecados que cometeu, e guardar todos os meus estatutos, e fizer o que é recto e justo, certamente viverá, não será morto" Ezequiel 18:4 e 21.
"...E os mortos foram julgados, segundo as suas obras, conforme o que se achava escrito nos livros [...] E, se alguém não foi achado no Livro da Vida, esse foi lançado para dentro do lago de fogo" Apocalipse 20:12 e 15.
Então, vemos em Génesis que a maldade do ser humano pesou no coração do Senhor, de maneira que teceu um julgamento perante a Terra: destruiria a todos, inclusive animais, excepto uma pessoa: Noé, pois era homem justo e recto perante a vontade do Pai.
Essa revelação de Deus como um Deus que pode sentir pesar e tristeza, deixa claro que Ele, em relação à Sua criação, age pessoalmente, como no afastamento de uma família. Ele tem um amor intenso pelo ser humano. No meio da iniquidade e maldade generalizadas daqueles dias, Deus achou em Noé um homem que ainda buscava comunhão com Ele e que se mantinha distante da imoralidade ao seu redor. Essa rectidão de Noé era fruto da graça de Deus nele, por meio da sua fé e do seu andar com Deus.
A salvação no Novo Testamento é obtida exactamente da mesma maneira, mediante a graça e a misericórdia de Deus, recebidas pela fé, cuja eficácia conduz o crente a um esforço sincero para andar com o Senhor e permanecer separado da geração ímpia ao seu redor. Hebreus 11:7 declara que Noé foi feito herdeiro da justiça, que é segundo a fé. O Novo Testamento também declara que ele não era somente justo, como também pregador da justiça. Nisso, ele é exemplo do que os pregadores devem ser.
"Pela fé, Noé, divinamente instruído acerca de acontecimentos que ainda não se viam e sendo temente a Deus, aparelhou uma arca para a salvação de sua casa; pela qual condenou o mundo e se tornou herdeiro da justiça que vem da fé" Hebreus 11:7.
Os filhos de Deus e as filhas dos homens
"Como se foram multiplicando os homens na terra, e lhes nasceram filhas, vendo os filhos de Deus que as filhas dos homens eram formosas, tomaram para si mulheres, as que, entre todas, mais lhe agradaram" Génesis 6:1-2.
As genealogias de Caim e Sete são lembradas com esta passagem. Existem muitos conflitos a envolver este texto, um deles seria a expressão "os filhos de Deus". A primeira grande controvérsia encontra-se no facto de alguns estudiosos acreditarem que esta designação estaria relacionada a anjos. Argumenta-se que os anjos caídos assumiram corpos físicos e vieram à Terra para ter relações sexuais com belas mulheres, união da qual teriam nascido gigantes iníquos.
Ainda que tal interpretação possa ser defendida, a visão da maioria das igrejas evangélicas, entre elas a do Evangelho Quadrangular, acredita que os "filhos de Deus" sejam os descendentes piedosos de Sete. Estes homens escolheram as suas esposas não pela sua opção religiosa, mas por impulso. Através desta escolha errada, configurou-se numa vida devassa, e então houve a corrupção da humanidade. Deus reagiu com ira divina e a Sua reacção em relação à sociedade aumentava de intensidade à medida que a corrupção se tornava dominante em escala universal.
A união destas duas linhagens gerou "Gigantes" ou "Nefilins", entretanto este termo gigante é usado na Septuaginta. No texto original, no hebraico, o tamanho da pessoa nada tem haver com o significado da palavra. O termo "Nefilim" significa, literalmente, "os caídos ou aqueles que caem sobre (atacam) os outros", ou seja, eram pessoas malignas. Sobre esta visão, argumenta-se que:
Em primeiro lugar, ao analisarmos o texto de Mateus 22:29-30, que diz:
"Respondeu-lhes Jesus: Errais não conhecendo as Escrituras nem o poder de Deus. Porque, na ressurreição, nem se casam, nem se dão em casamento; são, porém, como os anjos do céu" Mateus 22:29-30.
Entendemos que as paixões e os apetites sexuais são especificamente manifestações do corpo humano e não dos anjos celestiais. Em segundo lugar, não foi a união entre os "filhos de Deus" e as "filhas dos homens" que nasceram os gigantes. Pelo contrário, eles já existiam antes desse acontecimento. Vejamos:
"Havia naqueles dias gigantes na terra; e também depois, quando os filhos de Deus entraram às filhas dos homens e delas geraram filhos; estes eram os valentes que houve na antiguidade, os homens de fama" Génesis 6:4.
Em terceiro lugar, caso esses "filhos de Deus" fossem anjos decaídos, seriam demónios e não mais "filhos de Deus"; logo, não poderiam ser considerados como tais. Enquanto que os descendentes de Sete "invocaram o nome do Senhor", tal como o próprio Sete (Génesis 4:26), ou seja, possuíam comunhão com Deus, andavam com Deus, como Enoque (Génesis 5:29; 6:8) e obtiveram testemunho de que agradaram a Deus e se tornaram herdeiros da justiça, que é segundo a fé (Hebreus 11:5-7).
Os Filhos de Deus e as Filhas dos Homens (Génesis 6:1-8)
Introdução
As tentativas de se produzir uma raça superior não tiveram início com Adolf Hitler, nem terminaram com ele. A nossa geração parece ter fixação por super humanos. O Super Homem, o Homem Biónico, Mulher Biónica, Hulk, e muitos outros personagens da televisão versam sobre o mesmo tema. E o domínio dessa super-raça não deve ser entendido apenas no campo da ficção. É quase assustador saber que os geneticistas vêm andado a tentar criar humanos superiores enquanto o aborto pode se tornar um meio de eliminar sistematicamente os indesejáveis. No outro dia, leu-se no jornal um artigo que falava sobre uma organização que disponibiliza o esperma de vencedores de Prémios Nobel para determinadas mulheres. Contudo, é bem mais difícil determinar as últimas consequências dessas tentativas do que encontrar a sua origem. O seu início está registado no sexto capítulo do livro de Génesis. Em geral, as maiores dificuldades com esta passagem vêm dos teólogos conservadores. Isto se deve ao facto da narrativa ser classificada como uma lenda por aqueles que não a levam a sério. Os eruditos conservadores precisam explicar este episódio de acordo com aquilo que Moisés afirmou ser, um acontecimento histórico. Embora o texto suscite grandes diferenças de interpretação, isso não tem muita importância, pois não irá afectar o fundamento da salvação eterna de ninguém. Em geral, as pessoas de quem mais se discorda são justamente os nossos irmãos em Cristo.
Quem, afinal, são os "Filhos de Deus"?
A interpretação de Génesis 6:1-8 depende da definição de três termos-chave: "os filhos de Deus" (Génesis 6:2 e 4), "as filhas dos homens" (Génesis 6:2 e 4), e os "nefilins" (Génesis 6:4). Existem três interpretações principais destes termos que tentaremos descrever, ao começar por aquela que, ao nosso ver, é a menos provável, e a terminar com a que nos parece mais satisfatória.
Posição 1: A União dos Ímpios Descendentes de Caim com os Piedosos Descendentes de Sete
Segundo quem defende este ponto de vista, "os filhos de Deus" são os homens piedosos da linhagem de Sete. As "filhas dos homens", as filhas dos ímpios cainitas. E os "nefilins", os homens ímpios e violentos resultantes dessa união pecaminosa.
O principal fundamento para essa interpretação é o contexto de Génesis 4 e 5. Génesis 4 descreve a ímpia geração de Caim, enquanto em Génesis 5 vemos a piedosa linhagem de Sete. Em Israel, a separação era uma parte vital da responsabilidade religiosa daqueles que verdadeiramente adoravam a Deus. O acontecimento de Génesis 6 foi uma transgressão dessa separação que ameaçou a descendência piedosa da qual devia nascer o Messias. Essa transgressão foi a causa do dilúvio que viria a seguir. O mundo ímpio foi destruído e o justo Noé e a sua família, por meio de quem seria cumprida a promessa de Génesis 3:15, foram preservados.
Embora esta interpretação tenha a característica louvável de explicar a passagem sem criar problemas doutrinários ou teológicos, o que ela oferece em termos de rigor é feito às custas de uma interpretação aceitável. Em primeiro lugar, as definições dadas por essa interpretação não emergem do texto ou mesmo se adaptam a ele. Em lugar algum os descendentes de Sete são chamados de "os filhos de Deus".
O contraste entre a linhagem piedosa de Sete e a linhagem ímpia de Caim talvez seja enfatizado demais. Não temos certeza absoluta de que a linhagem de Sete, como um todo, tenha sido piedosa. Enquanto todos os descendentes da linhagem de Caim parecem ter sido ímpios, só um punhado dos descendentes de Sete são chamados de piedosos. O ponto que Moisés deseja ressaltar em Génesis 5 é que Deus preservou um remanescente justo pelo qual as Suas promessas a Adão e Eva seriam cumpridas. Tem-se a distinta impressão de que bem poucas pessoas temiam a Deus naqueles dias (Génesis 6:5-7, 12). Aparentemente, só Noé e a sua família podiam ser chamados de justos na época do dilúvio. Teria Deus deixado de salvar algum justo?
Além disso, "as filhas dos homens" dificilmente poderiam se limitar somente às filhas dos cainitas. Em Génesis 6:1 Moisés escreveu: "como se foram multiplicando os homens na terra, e lhes nasceram filhas". É difícil concluir que os "homens" aqui não sejam os homens em geral ou a raça humana. Segue-se que a referência às suas "filhas" seria igualmente geral. Deduzir que as "filhas dos homens" em Génesis 6:2 seja algo diferente, um grupo mais restrito, é ignorar o contexto da passagem. Por estas e outras razões, devemos concluir que esta posição é digamos inaceitável. Embora cumpra os requisitos no seu rigor, ela não se submete às leis da interpretação.
Posição 2: A Interpretação dos Déspotas (autoritários)
Ao reconhecer as deficiências da primeira posição, alguns eruditos procuraram definir a expressão "os filhos de Deus" ao compará-la com as línguas do antigo Oriente Próximo. É interessante saber que alguns governantes eram identificados com filho de um deus em particular. No Egipto, por exemplo, o rei era chamado de filho de Rá. No Antigo Testamento, a palavra hebraica para Deus, Elohim, é usada para homens em posição de autoridade:
"Então, o seu senhor o levará aos juízes que agirão em nome de Deus" (Êxodo 21:6).
Deus assiste na Sua própria congregação; Ele julga no meio dos governantes (literalmente, os deuses, Salmo 82:1 e 6). Esta interpretação, como a dos anjos caídos, tem as suas raízes na antiguidade. De acordo com esta proposta, os "filhos de Deus" são nobres, aristocratas e reis. Esses homens autoritários ambiciosos cobiçavam poder e riqueza e queriam tornar-se "homens de renome", ou seja, célebres (Génesis 11:4)! O seu pecado não era o "casamento misto entre dois grupos, ou entre dois mundos (anjos e homens), ou entre duas comunidades religiosas (descendentes de Sete e de Caim), ou ainda entre duas classes sociais (plebe e realeza) - o seu pecado era a poligamia". Era o mesmo tipo de pecado de Lameque, o descendente de Caim, o pecado da poligamia, mais especificamente visto na forma de um harém, instituição característica da corte de um antigo déspota oriental. Nessa transgressão, os "filhos de Deus", com frequência, violavam o dever sagrado do seu ofício como guardiães das ordenanças gerais de Deus para a conduta humana. No contexto de Génesis 4 e 5, encontramos algumas evidências que poderiam ser interpretadas como suporte ao ponto de vista sobre os déspotas. Caim edificou uma cidade e em seguida deu a ela o nome do seu filho Enoque (Génesis 4:17). As dinastias seriam mais facilmente estabelecidas num ambiente urbano. Sabemos, ainda, que Lameque teve duas mulheres (Génesis 4:19). Embora isso esteja bem longe de ser um harém, poderia ser visto como um passo nessa direcção. Esta posição também define "as filhas dos homens" como mulheres e não só como as filhas da linhagem de Caim.
Apesar desses factores, esta interpretação provavelmente nunca teria sido concebida não fossem os "problemas" criados pela posição sobre os anjos caídos. Embora os reis pagãos fossem considerados como filhos de alguma divindade, nenhum rei israelita foi assim designado. É bem verdade que os nobres e algumas autoridades foram, ocasionalmente, chamados de "deuses", mas não de "filhos de Deus". Essa interpretação prefere ignorar a definição precisa fornecida pelas próprias Escrituras.
Além disso, toda a idéia de homens famintos de poder, ao procurar estabelecer uma dinastia com a formação de um harém, parece forçada nessa passagem. Quem teria tirado essa idéia do próprio texto, a menos que impusesse isso a ele? E mais, a definição dos nefilins como a serem meros homens violentos e tirânicos também parece inadequada. Por que tais homens seriam mencionados com tanta deferência se fossem como quaisquer outros daquela época? (Génesis 6:11-12). Embora a interpretação dos déspotas seja menos violenta ao texto do que a dos descendentes de Sete e Caim, ainda assim ela nos parece inapropriada.
Posição 3: A Interpretação dos Anjos Caídos
De acordo com esta posição, os "filhos de Deus" de Génesis 6:2 e 4 são anjos caídos, os quais assumiram uma forma semelhante à dos homens. Esses anjos se casaram com mulheres da raça humana (descendentes de Caim ou de Sete) e a descendência resultante foram os nefilins. Os nefilins eram gigantes de superioridade física, os quais, por isso, se estabeleceram como homens de renome pelas suas proezas físicas e poderio militar. Essa raça de criaturas meio humanas foi varrida pelo dilúvio, junto com a humanidade em geral, pecadores confessos (Génesis 6:11-12).
A pressuposição básica na abordagem do nosso texto é que devemos deixar a Bíblia definir os seus próprios termos. Se as definições bíblicas não forem encontradas, então devemos examinar a linguagem e a cultura dos povos contemporâneos. No entanto, a Bíblia define para nós o termo "os filhos de Deus".
"Um dia em que os filhos de Deus vieram apresentar-se perante o Senhor, veio também Satanás entre eles" (Jó 1:6).
"Num dia em que os filhos de Deus vieram apresentar-se perante o SENHOR, veio também Satanás entre eles apresentar-se perante o SENHOR. (Jó 2:1).
"Quando as estrelas da alva, juntas, alegremente cantavam, e rejubilavam todos os filhos de Deus? (Jó 38:7; Salmos 89:6; Daniel 3:25).
Os eruditos que rejeitam esta posição prontamente reconhecem o facto de que o termo exacto é claramente definido na Escritura. A razão pela qual rejeitam a interpretação dos anjos caídos é por acharem que esse ponto de vista é uma afronta à razão e à Escritura.
A principal passagem problemática citada é a do evangelho de Mateus, onde o nosso Senhor disse: "Errais, não conhecendo as Escrituras nem o poder de Deus. Porque, na ressurreição, nem casam, nem se dão em casamento; são, porém, como os anjos no céu" (Mateus 22:29-30).
Eles dizem que o nosso Senhor falou que anjos não têm sexo, mas isso é mesmo verdade? Jesus estava a comparar homens no céu com anjos no céu. Não está escrito que, no céu, homens ou anjos sejam assexuados, e sim que no céu não haverá casamento. Não há anjos femininos com quem os anjos possam gerar descendência. Nunca foi dito aos anjos "crescei e multiplicai-vos", como foi dito ao homem. Quando encontramos anjos descritos no livro de Génesis, fica claro que eles podem assumir a forma humana, e que o seu sexo é masculino. O escritor aos Hebreus menciona o facto de eles poderem ser hospedados sem o conhecimento das pessoas (Hebreus 13:2). Com certeza, eles devem ser bem convincentes como homens. Os homossexuais de Sodoma eram muito bons para julgar a sexualidade. Eles foram atraídos pela "masculinidade" dos anjos que foram lá para destruir a cidade (Génesis 19:1 e seguintes, especialmente o versículo 5). No Novo Testamento, duas passagens parecem se referir ao incidente de Génesis 6, e dão base à interpretação dos anjos:
"Ora, se Deus não poupou a anjos quando pecaram, antes, precipitando-os no inferno os entregou a abismos de trevas, reservando-os para o juízo" (2 Pedro 2:4).
"E a anjos, os que não guardaram o seu estado original, mas abandonaram o seu próprio domicílio, ele tem guardado sob trevas, em algemas eternas, para o juízo do Grande Dia" (Judas 6).
Estes versículos podem indicar que alguns anjos que caíram com Satanás não ficaram contentes com o seu "próprio domicílio" e, por isso, começaram a viver entre os homens (e mulheres) como homens. O julgamento de Deus foi colocá-los em algemas para que não pudessem mais servir aos propósitos de Satanás na Terra como fazem os anjos caídos que ainda estão soltos a executar as suas ordens.
Os nefilins são claramente indicados como resultado da união entre os anjos caídos e as mulheres. Embora os estudos dessa palavra apresentem diversas sugestões para o significado do termo, a sua definição bíblica vem de apenas um outro exemplo na Escritura, Números 13:33:
"Também vimos ali gigantes (nefilins, os filhos de Anaque são descendentes de gigantes), e éramos, aos nossos próprios olhos, como gafanhotos e assim também o éramos aos seus olhos".
Portanto, entende-se que os nefilins sejam uma raça de super-humanos, produto dessa invasão angélica à Terra. Esta interpretação não só está em conformidade com o uso bíblico da expressão "filhos de Deus", como também é a que mais se encaixa no contexto da passagem. Os efeitos da queda são vistos na descendência ímpia de Caim (Génesis 4). Embora ele e os seus descendentes estivessem "sob o domínio de Satanás", Satanás conhecia muito bem as palavras de Deus de Génesis 3:15, que da descendência da mulher Deus traria o Messias que iria destruí-lo. Não sabemos se toda a linhagem de Sete foi temente a Deus. Na verdade, podemos supor exactamente o contrário. Só Noé e a sua família directa parecem justos na época do dilúvio.
Em Génesis 6 descreve-se uma tentativa desesperada de Satanás para atacar o remanescente piedoso mencionado em Génesis 5. Enquanto um descendente justo é preservado, a promessa de Deus paira sobre a cabeça de Satanás, como uma ameaça da sua destruição iminente.
As filhas dos homens não foram violentadas ou seduzidas. Elas simplesmente escolheram o marido da mesma forma que os anjos as seleccionaram - pela atracção física. Ora, se naquela época, nós fossemos uma mulher desimpedida, a quem escolheríamos? A um homem atraente e musculoso, famoso pela sua força e pelos seus feitos, ou a alguém que comparado a ele tivesse a aparência de um fraco?
Aquelas mulheres tinham esperança de ser a mãe do Salvador. Quem seria o pai mais provável dessa criança? Não seria um "valente de renome", que também podia se gabar de imortalidade? Alguns descendentes piedosos de Sete viveram quase 1000 anos, mas os nefilins não morreriam se fossem anjos. E assim começou uma nova raça.
Será que Deus Muda de Ideia?
Enquanto Génesis 6:1-4 ressaltam a invasão dos anjos no início de uma nova super-raça, Génesis 6:5-7 servem para informar que a humanidade em geral merecia a intervenção destrutiva de Deus na história - o dilúvio. No entanto, é aqui que encontramos um problema muito sério, pois quase parece que Deus muda de ideia, como se a criação do homem fosse um erro colossal da Sua parte. Vamos tratar, então, da questão: "Será que Deus muda de ideias?" Vários factores precisam ser considerados.
Primeiro, Deus é imutável, Ele não muda na Sua pessoa, na Sua perfeição, nos Seus propósitos e nas Suas promessas.
"Deus não é homem para que minta, e nem filho de homem para que se arrependa. Porventura tendo ele prometido não o fará, ou tendo ele falado, não o cumprirá?" (Números 23:19).
Também a glória de Israel não mente, nem se arrepende, porquanto não é homem, para que se arrependa. (1 Samuel 15:29; Salmos 33:11; 102:26-28; Hebreus 1:11-12; Hebreus 13:8; Malaquias 3:6; Romanos 11:29 e Tiago 1:17).
Segundo, há passagens nas quais "parece" que Deus muda de ideia.
"Disse mais o Senhor a Moisés: Tenho visto este povo, e eis que é povo de dura cerviz. Agora, pois, deixa-me, para que se acenda contra eles o meu furor, e eu os consuma; e de ti farei uma grande nação... Então, se arrependeu o Senhor do mal que dissera havia de fazer ao povo" (Êxodo 32:9-10, 14).
"Viu Deus o que fizeram, como se converteram do seu mau caminho e Deus se arrependeu do mal que tinha dito lhes faria e não o fez" (Jonas 3:10).
"Então o Senhor se arrependeu disso. Não acontecerá, disse o Senhor... E o Senhor se arrependeu disso. Também não acontecerá, disse o Senhor Deus" (Amós 7:3, 6).
Terceiro, nos casos onde Deus "parece" mudar de ideia, uma ou mais das seguintes considerações pode ser aplicada:
a) A expressão "Deus se arrependeu" é um antropomorfismo, ou seja, uma descrição de Deus que assemelha as Suas acções às acções do homem. De outra forma, como o homem poderia entender o pensamento de Deus? O "mudar de ideia" de Deus pode ser apenas a maneira de ver da perspectiva do homem. Em ambos os textos, de Génesis 22:2, 11-12) e de Êxodo 32, o que Deus propôs foi uma prova. Nos dois casos, o Seu propósito eterno não mudou.
b) Nos casos em que tanto julgamento quanto bênção são prometidos, pode haver uma condição implícita ou explícita. A mensagem pregada por Jonas aos ninivitas é um deles:
"Começou Jonas a percorrer a cidade de caminho dum dia, e pregava, e dizia: Ainda quarenta dias, e Nínive será subvertida. Os ninivitas creram em Deus e proclamaram um jejum, e vestiram-se de pano de saco, desde o maior até o menor. Chegou esta notícia ao rei de Nínive: ele levantou-se do seu trono, tirou de si as vestes reais, cobriu-se de pano de saco e assentou-se sobre a cinza. E fez-se proclamar e divulgar em Nínive: Por mandato do rei e seus grandes, nem homens, nem animais, nem bois, nem ovelhas provem coisa alguma, nem, os levem ao pasto, nem bebam água; mas, sejam cobertos de pano de saco, tanto os homens como os animais, e clamarão fortemente a Deus; e se converterão, cada um do seu mau caminho e da violência que há nas suas mãos. Quem sabe se voltará Deus, e se arrependerá, e se apartará do furor da sua ira, de sorte que não pereçamos?" (Jonas 3:4-9).
O que era desejado pelos ninivitas, para Jonas era um facto. Eles clamaram por misericórdia e perdão, no caso de Deus poder ouvir e perdoar. Quando eles se arrependeram e Deus demonstrou compaixão, Jonas ficou louco de raiva:
"Com isso, desgostou-se Jonas extremamente e ficou irado. E orou ao Senhor e disse: Não foi isso o que eu disse, estando ainda na minha terra? Por isso, me adiantei, fugindo para Társis, pois sabia que és Deus clemente, e misericordioso, e tardio em irar-se, e grande em benignidade, e que se arrepende do mal" (Jonas 4:1-2).
Jonas sabia que Deus era amoroso e clemente. A mensagem pregada por ele indicava uma excepção. Se os ninivitas se arrependessem, Deus os perdoaria. Foi sobre isso que Jeremias escreveu, dizendo:
"No momento em que eu falar acerca de uma nação de ou de um reino para o arrancar, derribar e destruir, se tal nação se converter da maldade contra a qual eu falei, também eu me arrependerei do mal que pensava fazer-lhe. E, no momento em que eu falar acerca de uma nação ou de um reino, para o edificar e plantar, se ele fizer o que é mal perante mim e não der ouvidos à minha voz, então, me arrependerei do bem que houvera dito lhe faria" (Jeremias 18:7-10).
c) Embora o decreto de Deus não possa ser alterado, precisamos admitir que Ele é livre para agir como quiser. E, embora o Seu roteiro possa mudar, os Seus propósitos não mudam, "porque os dons e a vocação de Deus são irrevogáveis" (Romanos 11:29).
Deus prometeu levar o Seu povo à terra de Canaã. Devido à sua incredulidade, a primeira geração não tomou posse da terra, mas a segunda sim. Quando Jesus veio, Ele Se ofereceu a Israel como o Messias. A rejeição de Israel tornou possível oferecer o evangelho aos gentios. Apesar disso, quando os propósitos de Deus para os gentios forem cumpridos, Deus derramará a Sua graça e salvação novamente sobre os judeus. O roteiro de Deus pode mudar, mas não os Seus propósitos (Romanos 9-11).
d) Ainda que a vontade de Deus (o Seu decreto) não possa mudar e não mude, Ele é livre para mudar as Suas emoções. Génesis 6:6-7 descreve a reacção de Deus ao pecado humano. Pesar é a resposta de amor ao pecado. Deus não é insensível; Ele é uma pessoa que Se regozija na salvação do homem e na sua obediência, e que Se aflige diante da incredulidade e da desobediência. Embora o propósito de Deus para a raça humana não mude, a Sua atitude muda. Com certeza, um Deus Santo deve Se sentir diferente com relação ao pecado e com relação à obediência. Esse é o ponto de Génesis 6:6-7. Deus é afligido pelo pecado do homem e das suas consequências. No entanto, Ele cumprirá os Seus propósitos independentemente disso. Embora tal circunstância tenha sido decretada desde a eternidade passada, Deus jamais poderia se regozijar nela, só lamentar a maldade e a obstinação do homem.
Uma ilustração semelhante é a reacção emocional do nosso Senhor no Jardim do Getsemani (Mateus 26:36 e seguintes). Desde a eternidade passada Ele tinha Se proposto a ir à cruz para comprar a salvação do homem. No entanto, quando o momento da Sua agonia se aproximou, Ele teve medo. O Seu propósito não mudou, mas as Suas emoções, sim.
O Significado desta Passagem para o Israel Antigo
Para os antigos israelitas esta passagem ensinou diversas lições valiosas. Primeiro, ela lhes deu uma explicação adequada para o dilúvio. Podemos entender que aquela super-raça tinha de ser eliminada. O dilúvio não foi apenas uma forma de Deus julgar os homens pecaminosos, mas também de cumprir a Sua promessa de trazer salvação pelo descendente da mulher. Se o relacionamento entre anjos e homens não tivesse sido interrompido, o remanescente piedoso teria deixado de existir (humanamente falando). Segundo, a passagem ilustrou o que Deus tinha dito à serpente, Adão e Eva: "Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e o seu descendente" (Génesis 3.15).
Israel não ousou esquecer que havia uma intensa batalha a ser travada, não só entre os descendentes de Caim e Sete, mas entre Satanás e o descendente da mulher. Embora nós estejamos acostumados a tal ênfase no Novo Testamento, os antigos tinham poucas referências directas a Satanás ou aos seus assistentes demoníacos (Génesis 3; Deuteronómio 32:17; 1 Crónicas 21:1; Jó 1 e 2; Salmo 106:37; Daniel 10:13; Zacarias 3:1-2). Esta passagem seria uma vivida lembrança da exactidão da Palavra de Deus. Terceiro, a passagem ressaltou a importância de Israel manter a sua pureza racial e espiritual. O remanescente crente em Deus tinha de ser preservado. Quando os homens deixaram de perceber a importância disso, Deus teve de julgá-los com rigor. Quando a nação entrasse na terra de Canaã, poucas lições seriam mais importantes do que a necessidade de separação.
O Significado de Génesis 6 para os Cristãos Actuais
Muito embora o Novo Testamento tenha muito mais a dizer sobre as actividades de Satanás e dos seus demónios, poucos de nós parecem levar a sério a nossa luta espiritual. Nós realmente acreditamos que a igreja consegue operar somente com o esforço e a sabedoria humana, ou com uma pequena ajuda de Deus. Muitas vezes tentamos viver a vida espiritual no poder da carne. Dizemos às pessoas para fazer uma nova dedicação da sua vida e redobrar os seus esforços, mas deixamos de lhes dizer que a nossa única força é aquela que Deus nos dá. Hoje, a batalha travada entre os filhos de Satanás e os filhos de Deus (no sentido do Novo Testamento - João 1:12; Romanos 8:14, 19) é muito mais intensa do que foi nos tempos antigos. O destino de Satanás está selado e os seus dias estão contados (Mateus 8:29). Vamos, pois, nos revestir da armadura espiritual de Deus para a luta espiritual de que somos parte (Efésios 6:10-20).
Em segundo lugar, precisamos entender que Satanás ainda hoje nos ataca com os mesmos instrumentos. Não conhecemos nenhum caso de seres angélicos caídos a invadir a Terra em forma humana para promover a causa de Satanás nos nossos dias. No entanto, Satanás continua a trabalhar subtilmente por intermédio dos homens.
"Porque os tais são falsos apóstolos, obreiros fraudulentos, transformando-se em apóstolos de Cristo. E não é de se admirar, porque o próprio Satanás se transforma em anjo de luz. Não é muito, pois, que os seus próprios ministros se transformem em ministros de justiça; e o fim deles será conforme as suas obras" (2 Coríntios 11:13-15).
Assim como Satanás procurou corromper os homens ao manifestar-se (ou melhor, os seus anjos) na forma de seres humanos superiores, hoje ele usa os "anjos de luz". A nossa tendência é supor que, na maioria das vezes, ele use os perversos. Às vezes, até parece que esperamos encontrá-lo num patético endemoninhado ou num pobre-coitado desesperado. É fácil atribuir a Satanás esse tipo de coisa. No entanto, o seu melhor trabalho e, na nossa opinião, o mais comum, é quando usa pregadores aparentemente piedosos, devotos e religiosos que estão atrás do púlpito, ou se assentam no Conselho da igreja, ao falar de salvação em termos de comunidade e não de almas, e pelas obras ao invés da fé. Satanás continua a promover a sua causa ao usar homens que não são o que parecem ser. Por fim, vamos observar que o melhor trabalho de Satanás está justamente nas áreas onde homens e mulheres depositam a esperança da sua salvação. Quando os homens-anjos pediram as filhas dos homens em casamento, eles deviam parecer pais dos mais promissores. Se tais criaturas fossem imortais, a sua descendência também não seria? Seria esta a forma de Deus reverter os efeitos da queda e da maldição? Assim deve ter parecido àquelas mulheres.
E é exactamente isso o que Satanás faz ainda hoje. Ah, mas não devemos pensar que ele esteja a auto-promover-se através do ateísmo ou de outros "ismos", pois o lugar onde ele faz mais sucesso é justamente na religião. Ele usa a sua expressão mais piedosa e emprega terminologia religiosa. Ele não procura acabar com a religião, mas retira dela o seu elemento crucial, a fé no sangue derramado de Jesus Cristo como substituto para o pecado dos homens. Ele está sempre pronto a juntar-se a qualquer causa religiosa, desde que esse ingrediente seja omitido ou distorcido, ou fique perdido num labirinto de legalismo e libertinagem. Cuidado, meus amigos, Satanás está no mundo da religião. Que melhor maneira de desviar a alma dos santos e de cegar a mente dos homens (2 Coríntios 4:4)?
Onde está a nossa esperança de imortalidade? Está na nossa descendência? Isso não funcionou para Caim. Está no nosso trabalho? Nós queremos construir um império ou erigir um monumento dedicado ao nosso nome? Não seremos os últimos. Tudo isso sucumbiu no dilúvio do julgamento de Deus. Só a fé no Deus da Bíblia e, mais especificamente, no Filho enviado por Ele, nos dará imortalidade e nos libertará da maldição. A única maneira para isso acontecer é nos tornarmos filhos de Deus por intermédio do Filho de Deus.
"Jesus lhe disse: Eu sou o caminho, a verdade e a vida, ninguém vem ao Pai senão por mim" (João 4:6).
O Dilúvio (Génesis 6:9 - 8:22)
Introdução
O mundo conhece muito pouco sobre a Bíblia, mas são poucas as pessoas que desconhecem a história da arca de Noé. Ela é tema de piadas, de pinturas, de filmes sobre a sua busca e até mesmo de representações em cerâmica. O conhecimento a respeito do dilúvio é quase universal, mesmo fora do relato bíblico do livro de Génesis. No entanto, devido a certas indicações na narrativa de Génesis e também porque em todos os continentes e entre quase todos os povos são encontradas histórias sobre uma grande inundação, parece que devemos concluir que o dilúvio de Génesis se não abrangeu toda a Terra, no mínimo englobou toda a raça humana. Todos os relatos referem-se a um dilúvio destrutivo ocorrido nos primórdios de cada uma dessas histórias tribais. Em cada caso, um ou mais indivíduos foram salvos e foram encarregados de repovoar a Terra. Até agora, os antropólogos já reuniram cerca de 250 a 300 dessas histórias.
Essa familiaridade com a história é o maior obstáculo ao nosso aproveitamento do estudo do livro de Génesis. Quando abordamos o texto já estamos com a cabeça-feita, ao achar que nada ou quase nada irá mudar o nosso pensamento ou a nossa atitude. Vamos supor, por exemplo, que o tema da história seja juízo e destruição, o que, de certa forma, é verdade. Hollywood faria um estardalhaço em cima disso. Veríamos tudo quanto é tipo de acto pecaminoso representado na tela. Quando o enredo já tivesse esgotado as cenas de luxúria, o foco seria voltado para a destruição e violência. Famílias seriam separadas por correntes tempestuosas. Bebés seriam arrancados das suas mães. Prédios iriam rachar e desmoronar na inundação.
Embora essa pareça ser a força propulsora da narrativa, não existem palavras para descrever o processo real que resultou em agonia, sofrimento e morte. Nenhuma cena se passa diante dos nossos olhos de tal devastação. O julgamento, com certeza, é um dos temas do que aconteceu, mas, graças a Deus, há um tema muito maior, o da graça salvadora de Deus. Embora não nos atrevamos a ignorar as advertências do texto, também não podemos perder de vista o seu encorajamento.
Enquanto algumas pessoas atentam para o pecado e a devastação do dilúvio, outras se preocupam com o que causou a inundação, não com o seu significado. Estamos certos de que há muita coisa interessante neste acontecimento para as mentes científicas, no entanto, gostaríamos de chamar a atenção para o facto de que muito do que é proposto em nome da ciência é apenas teoria e especulação. Não desejamos de forma alguma desacreditar ou desencorajar as pesquisas sobre isso. Só queremos dizer que não ousamos construir a nossa vida sobre elas e ressaltar que esse tipo de abordagem não é o foco principal da narrativa do dilúvio em Génesis.
Uma análise detalhada desse fenómeno não é o propósito deste estudo, e sim uma visão ampla do significado e da mensagem do dilúvio para as pessoas de todas as épocas. Ao ter isso em mente, vamos voltar a nossa atenção para o texto.
Preparação (Génesis 6:9 - 7:5)
De modo geral, este trecho trata dos preparativos necessários para o dilúvio. As razões são dadas em Génesis 6:9-12. A revelação é feita a Noé em Génesis 6:13-21. A ordem para entrar na arca está em Génesis 7:1-4. Génesis 6:22 e 7:5 registam a obediência de Noé às instruções divinas.
Em Génesis 6:9-12 e os versículos finais de Génesis 8 são os mais importantes desta passagem, pois ressaltam as razões para o dilúvio e o propósito de Deus para a história. Por isso, vamos dedicar a maior parte deste estudo a estes versículos, bem como às passagens do Novo Testamento que tratam deste assunto.
Enquanto o dilúvio foi proposto para destruir a raça humana, a arca foi designada para salvar Noé e a sua família, e garantir o cumprimento do propósito divino para a criação e da promessa de salvação de Génesis 3:15. A chave para o entendimento desta história está na compreensão do contraste entre Noé e a sua geração.
"Noé era homem justo e íntegro entre os seus contemporâneos; Noé andava com Deus" (Génesis 6:9).
Noé era um homem justo. O seu carácter é descrito por apenas duas palavras: justo e íntegro. A palavra justo (do hebraico saddiq)... é comummente usada em referência aos homens. Significa que eles se ajustam a um padrão. Uma vez que Noé se ajustava ao padrão divino, ele recebeu a aprovação de Deus. No entanto, o termo é basicamente forense. Por isso, embora haja aprovação divina, esta não implica em perfeição da parte de Noé. Implica simplesmente em que as coisas que Deus busca num homem estavam presentes na vida dele. Sem qualquer pretensão a ser perfeito, Noé foi um homem que deu crédito à Palavra de Deus. Ele satisfez a expectativa divina para o homem, enquanto o resto da humanidade era vil.
A segunda expressão usada para Noé é "íntegro" (Génesis 6:9). A palavra hebraica é tamim. "Uma vez que a raiz hebraica envolve a idéia de 'completo', é justo concluir que somente aquela vida era completa em todos os sentidos, bem estruturada e com todas as qualidades essenciais".
Ao abandonar essas duas expressões técnicas, Moisés resumiu a vida de Noé ao escrever: "Noé andava com Deus" (Génesis 6:9). Com isso ele deu ênfase ao relacionamento entre Noé e Deus, a intimidade entre eles. Isso também reflecte a continuidade daquela convivência. Era um caminhar diário, confiante. Sem dúvida, esse relacionamento tinha como base a revelação acerca da criação do homem e da sua queda. Mais especificamente, devia incluir a promessa de redenção de Génesis 3:15. E, com toda a probabilidade, alguma outra revelação não registada por Moisés.
A justiça de Noé era baseada mais na sua fé em Deus do que no temor das consequências da desobediência. Ele não fazia ideia do julgamento divino que ia ser infligido à Terra até Deus lhe revelar pessoalmente (Génesis 6:13 e seguintes). Esta revelação do derramamento da ira divina foi resultado do relacionamento directo de Noé com Deus. Se os homens tivessem sido avisados do dilúvio que estava por vir, eles poderiam muito bem ter obedecido a Deus simplesmente por medo da punição. O relacionamento entre Noé e Deus não era motivado por tal temor, mas pela fé. Fé, não medo, é o motivo bíblico para um relacionamento com Deus (embora deva haver um certo temor respeitoso). Vamos ser bem claros quanto à justiça de Noé. Era uma justiça que veio pela fé.
"Pela fé, Noé, divinamente instruído acerca de acontecimentos que ainda não se viam e sendo temente a Deus, aparelhou uma arca para a salvação de sua casa; pela qual condenou o mundo e se tornou herdeiro da justiça que vem pela fé" (Hebreus 11:70).
Não foram as obras de Noé que o preservaram do julgamento, mas a graça. "Mas Noé achou graça diante do Senhor" (Génesis 6:8). Salvação é pela graça, mediante a fé, não por obras, mas para boas obras (Efésios 2:8-10).
Em contraste com a justiça de Noé estava a corrupção do homem: "A terra estava corrompida à vista de Deus e cheia de violência. Viu Deus a terra, e eis que estava corrompida, porque todo o ser vivente havia corrompido o seu caminho na terra" (Génesis 6:11-12).
Somente Noé era justo nos seus dias. "Disse o Senhor a Noé: Entra na arca, tu e tua casa, porque reconheço que tens sido justo diante de mim no meio desta geração" (Génesis 7:1).
O que isso nos diz acerca da família de Noé não sabemos, mas não dá para acreditar que todos os que entraram na arca não acreditassem em Deus, pelo menos após o dilúvio! Não havia outros justos para serem introduzidos na arca, pois ninguém mais andava com Deus. Todos os justos relacionados a Génesis 5 morreram antes da ocorrência do dilúvio. Pela sua própria natureza, os homens eram depravados e corruptos. O que Deus determinou destruir já tinha se auto-destruído. O relacionamento entre o homem e o seu semelhante podia ser resumido com apenas uma palavra: "violência". Gostaria que percebessem que em parte alguma Moisés especifica os pecados daquela geração. Isso poderia despertar a nossa curiosidade ou luxúria. Mais ainda, não acreditamos que as pessoas daquela época foram destruídas por se terem tornado uma sociedade totalmente decadente. O pecador que bate na mulher, ou pratica a homossexualidade, ou vive com uma garrafa pelos becos, não é, necessariamente, a pessoa mais vil aos olhos de Deus. Desconfia-se que muitas pessoas mortas no dilúvio foram pessoas religiosas. Imagina-se que a sociedade daqueles dias não era muito diferente, em questão de carácter, de muitas outras, a não ser por uma notável excepção: aparentemente elas não tinham qualquer tipo de restrição. A questão é que, homens educados, bem barbeados, gentis com senhoras idosas, etc, mas fraudam o imposto de renda ou se aproveitam dos outros, são tão pecadores quanto aqueles cujos pecados são socialmente inadmissíveis.
A principal manifestação do pecado do homem é a sua rebelião contra Deus e o seu espírito independente. Ele supõe que, embora Deus exista, Ele não se importa com o que as pessoas façam ou em que creiam. E, caso Se importe, não é muito. Pior ainda é a conclusão de que isso não é, de forma alguma, da conta de Deus. Vamos observar como Deus condena esse tipo de atitude:
"Então, me respondeu: A iniquidade da casa de Israel e de Judá é excessivamente grande, a terra se encheu de sangue, e a cidade, de injustiça; e eles ainda dizem: O SENHOR abandonou a terra, o SENHOR não nos vê. Também quanto a mim, os meus olhos não pouparão, nem me compadecerei; porém sobre a cabeça deles farei recair as suas obras" (Ezequiel 9:9-10).
As inclinações perversas do homem pairam sobre as chamas do inferno por causa da sugestão ou crença de que, embora Deus exista, Ele não se preocupa com o pecado, nem intervém na história humana para tratar dele. Esse tipo de pensamento é fatal. Deus não escondeu de Noé os Seus intentos. Ele lhe revelou a Sua decisão de destruir a civilização perversa daquela época e de preservá-lo, bem como ao descendente por meio de quem a promessa de salvação seria cumprida. Noé recebeu a revelação de que essa destruição viria por meio de um dilúvio, e que ele e a sua família seriam salvos por meio de uma arca. Mesmo ao não ser necessário para nós o registo de todas as instruções para a construção da arca, é preciso observar que os detalhes fornecidos são específicos, até no que se refere à colecta de alimento. A arca era um barco incrível, 135 metros de comprimento, 22,5 metros de largura e 13,5 metros de altura (Génesis 6:15). Ela serviria para salvar tanto o homem quanto os animais.
A Preservação do Homem e dos Animais (Génesis 7:6 - 8:19)
A arca, agora completa, ao ter sido construída ao longo de muitos anos de acordo com o plano divino, é ocupada ao mando de Deus (Génesis 7:1) pelo homem e pelos animais. Antes do início do dilúvio, Deus fecha a porta. Imagina-se que se não fosse assim, Noé a teria aberto para quem depois quisesse entrar. No entanto, o dia de salvação tinha de chegar ao fim.
A fonte de água parece sobrenatural. Talvez nunca tivesse chovido (Génesis 2:6). Agora a chuva era torrencial. Além disso, as "fontes do grande abismo" (Génesis 7:11) foram abertas. A água, vinda de cima e de baixo, irrompe durante quarenta dias (Génesis 7:12). As águas prevalecem durante 150 dias (Génesis 7:24) sobre a terra, e, em seguida, diminuem ao longo de alguns meses. Cinco meses após o início do dilúvio, a arca pousa sobre o monte Ararate (Génesis 8:4; 7:11). Leva um tempo considerável para que elas retrocedam e o solo fique seco o suficiente para se andar sobre ele. Noé e a sua família passaram pouco mais de um ano dentro da arca. Ao mando do Senhor, alegremente (de certeza) eles desembarcam.
A Promessa (Génesis 8:20-22)
A primeira coisa que Noé faz ao colocar os pés em terra firme é oferecer sacrifícios a Deus. Esta é mais uma evidência da sua fé e, com certeza, expressão da sua gratidão pela salvação proporcionada por Deus. Em resposta ao sacrifício de Noé, Deus faz uma promessa solene. No entanto, este é um compromisso firmado na mente de Deus - é uma promessa que Ele faz a Si mesmo. A manifestação dessa decisão é dada a Noé em Génesis 9. Isto é o que Deus propôs Consigo mesmo:
"E o Senhor aspirou o suave cheiro e disse Consigo mesmo: Não tornarei a amaldiçoar a terra por causa do homem, porque é mau o desígnio íntimo do homem desde a sua mocidade; nem tornarei a ferir todo vivente, como fiz. Enquanto durar a terra, não deixará de haver sementeira e ceifa, frio e calor, verão e inverno, dia e noite" (Génesis 8:21-22).
A resolução de Deus é que Ele nunca mais irá amaldiçoar a Terra ou destruir todas as coisas viventes como tinha feito. Por que Ele assumiria um compromisso assim? Com certeza Ele não estava triste pelo que havia feito. O pecado tinha de ser julgado, não tinha?
O problema com o dilúvio é que os seus efeitos foram apenas temporários. O problema não estava na criação, mas no pecado. Não estava nos homens, mas no homem. Apagar o passado e começar tudo de novo não adianta, pois o que é preciso é um novo homem para a criação. Esta é a ardente expectativa da criação.
"Pois a criação está sujeita à vaidade, não voluntariamente, mas por causa daquele que a sujeitou, na esperança de que a própria criação será redimida do cativeiro da corrupção, para a liberdade da glória dos filhos de Deus" (Romanos 8:20-21).
Portanto, Deus decidiu lidar de forma diferente com o pecado no futuro. Embora o pecado tenha sofrido um revés temporário no dilúvio, ele sofrerá um golpe fatal com a vinda do Messias. É nessa época que os homens se tornarão novas criaturas (2 Coríntios 5:17). Depois de cuidar dos homens, Deus providenciará também um novo céu e uma nova terra (2 Pedro 3:13).
Em resposta à oferta sacrificial feita por Noé como expressão da sua fé, Deus renova a Sua promessa de salvação final e definitiva. Até o dia quando essa salvação for consumada, Deus garante ao homem que medidas como o dilúvio não serão tomadas novamente.
O Significado do Dilúvio para as Pessoas de Todas as Épocas
Em primeiro lugar, o dilúvio é uma lembrança da graça ímpar de Deus. Enquanto os incrédulos acharam julgamento, Noé achou graça (Génesis 6:8). Até certo ponto, todas as pessoas daquela época experimentaram a graça de Deus. Somente 120 anos após a sua revelação foi que o juízo de Deus realmente caiu sobre os homens. Esse período foi uma época de graça na qual o evangelho foi proclamado.
A diferença entre Noé e quem morreu no dilúvio foi a sua reacção à graça de Deus. Aqueles que pereceram interpretaram a graça de Deus como indiferença divina. Eles concluíram que Deus não Se importava nem Se incomodava com o pecado dos homens. Noé, por outro lado, entendeu a graça exactamente como ela é - uma oportunidade para ter relacionamento íntimo com Deus e, ao mesmo tempo, evitar o desprazer e o juízo divino. Os anos de Noé foram gastos a andar com Deus, ao construir a arca e a proclamar a Sua Palavra.
A graça de Deus é claramente vista nesta promessa: "Enquanto durar a terra, não deixará de haver sementeira e ceifa, frio e calor, verão e inverno, dia e noite" (Génesis 8:22). Eis a ironia da nossa época. Como nos dias de Noé, o pecador perdido vê a vida como ela é e pergunta: "Como é que Deus pode realmente existir e não fazer nada para endireitar as coisas - para dar um jeito nelas?" Ele conclui que Deus ou está morto, ou não Se importa, ou não consegue lidar com o mundo do jeito que ele é, ao fazer pouco da advertência de 2 Pedro 3:8-9:
"Há, todavia, uma coisa, amados, que não deveis esquecer: que, para o Senhor, um dia é como mil anos, e mil anos como um dia. Não retarda o Senhor a sua promessa, como alguns a julgam demorada, pelo contrário, Ele é longânimo para convosco, não querendo que nenhum pereça, mas que todos cheguem ao arrependimento".
Como Noé, o crente reconhece que a vida como ela se encontra é reflexo do controle soberano de um Deus gracioso sobre todas as coisas:
"Pois, Nele, foram criadas todas as coisas, nos céus e sobre a terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos, sejam soberanias, quer principados, quer potestades. Tudo foi criado por meio Dele e para Ele. Ele é antes de todas as coisas. Nele, tudo subsiste" (Colossenses 1:16-17).
A continuidade das coisas como elas são - dia e noite, Verão e Inverno, tempo de flores e tempo de frutos - faz o cristão dobrar os joelhos diante de Deus em louvor e submissão pelo Seu cuidado providencial. Os não-crentes, no entanto, distorcem essa promessa como desculpa para pecar:
"Tendo em conta, antes de tudo, que, nos últimos dias, virão escarnecedores com os seus escárnios, andando segundo as próprias paixões e dizendo: Onde está a promessa de sua vinda? Porque, desde que os pais dormiram, todas as coisas permanecem como desde o princípio da criação" (2 Pedro 3:3-4).
Eles não reconhecem que esse tempo é concedido aos homens para arrependimento e reconciliação com Deus. No entanto, assim como o período da graça terminou nos dias de Noé, assim será para os homens hoje:
"Virá, entretanto, como ladrão, o Dia do Senhor, no qual os céus passarão com estrepitoso estrondo, e os elementos se desfarão abrasados; também a terra e as obras que nela existem serão atingidas" (2 Pedro 3:10).
O Nosso Senhor ensinou que os dias que precederão a Sua vinda para julgar a terra serão exactamente como os dias que antecederam o dilúvio:
"Pois assim como foi nos dias de Noé, também será a vinda do Filho do Homem. Porquanto, assim como nos dias anteriores ao dilúvio comiam e bebiam, casavam e davam-se em casamento, até ao dia em que Noé entrou na arca, e não o perceberam, senão quando veio o dilúvio e os levou a todos, assim será também a vinda do Filho do Homem" (Mateus 24:37-39).
Esses dias não são descritos em termos de sensualidade ou decadência, mas de normalidade - de coisas comuns. Os homens dos últimos tempos estarão a fazer aquilo que sempre fizeram. Não há nada de errado em comer e beber, casar-se ou comprar e vender. Errado é fazer essas coisas sem Deus, ao supor que podemos pecar como quisermos sem pagar o preço por isso. O tempo da graça chegará ao fim. Que saibamos reagir correctamente à graça de Deus.
Em segundo lugar, o dilúvio nos ensina sobre a ira de Deus. Aprendemos que, embora seja tardia, ela não falha. O juízo deve, finalmente, recair sobre aqueles que rejeitam a graça de Deus. Fique bem claro, no entanto, que embora a ira e o juízo sejam uma certeza, eles não dão prazer ao coração de Deus. Em lugar algum desta passagem há uma cena detalhada de angústia e sofrimento. Até os olhos de Noé foram poupados de ver o tormento sofrido por quem morreu no dilúvio. A arca não tinha vigias nem janelas por onde se pudesse olhar para a destruição feita por Deus. A única abertura era aquela no topo da arca ao permitir a entrada de luz. Deus não se deleita no juízo, nem o prolonga sem necessidade; no entanto, ele é certo para quem resiste à Sua graça. Não nos podemos deixar enganar, pois haverá uma época em que a oferta de salvação será retirada. Há algum tempo, certo pastor visitou uma senhora que estava a morrer de cancro. Não foi possível compartilhar o evangelho com ela na primeira visita dele, pois ela tinha de ser levada para terapia. Quando o pastor bateu à sua porta pela segunda vez, o seu marido atendeu e, pela abertura, ele pôde vê-la, obviamente enfraquecida pela doença. Quando o marido lhe perguntou se ela queria conversar com o pastor, ela balançou a cabeça ao dizer que não. Este pastor não a viu de novo até à sua morte. Muitas pessoas parecem pensar que podem esperar até estar com o pé na cova para serem salvas. Normalmente não acontece dessa maneira. Deus silenciosamente fecha a porta da salvação. Quando vivemos em pecado e rebelião contra Deus, não podemos nos dar ao luxo de tomar a decisão no leito de morte. Às vezes acontece, concordamos, mas é raro.
Além disso, muitas vezes o juízo de Deus permite que as coisas tomem o seu próprio rumo. A história do dilúvio parece até uma reversão às condições do segundo dia da criação (Génesis 1:6-7). No livro de Colossenses está escrito que o nosso Senhor Jesus Cristo é o Criador e Sustentador do universo (Colossenses 1:16-17). Quem rejeita a Deus vive como se Ele realmente não existisse. Na Grande Tribulação, Deus vai dar aos homens sete anos para descobrirem como é viver sem Ele. A mão de Deus que controla e restringe será retirada e o caos reinará. O juízo de Deus com frequência dá aos homens o que eles querem e o que merecem - as consequências naturais das suas acções. Por fim, vamos considerar a questão da salvação de Deus. No caso de Noé, precisamos observar que o caminho de Deus para a salvação era restritivo. Deus providenciou somente um meio de salvação (uma arca) e somente uma porta. Os homens não poderiam ser salvos da maneira que quisessem, só da maneira de Deus. Tal é a salvação oferecida por Deus aos homens hoje.
"Disse-lhe Jesus: Eu sou o caminho, a verdade e a vida, ninguém vem ao Pai senão por mim" (João 14:6).
A salvação da arca também tinha fins educativos. Ela nos dá uma imagem da salvação que foi cumprida em Cristo. Para aqueles da época de Moisés, ela foi um "tipo" de Cristo. A diferença entre quem foi salvo e quem morreu no dilúvio foi a diferença entre estar dentro ou fora da arca. Todos passaram pelo dilúvio, tanto quem foi salvo como quem morreu. Mas os sobreviventes foram aqueles que estavam dentro da arca, a qual os abrigou dos efeitos do desprazer divino de Deus pelo pecado. Tanto quem estava dentro da arca quanto quem estava fora dela sabia da sua existência e foi informado da advertência de Deus sobre o julgamento vindouro. Alguns escolheram ignorar esses factos, embora Noé os tenha alertado.
O mesmo acontece ainda hoje. Deus disse que é preciso haver punição para o pecado - a morte. Quem, pela fé, está em Cristo, recebe a ira de Deus em Cristo. Na cruz do Calvário a ira de Deus foi derramada sobre o Seu Filho sem pecado, Jesus Cristo. Quem Nele crê experimenta a salvação de Deus em Cristo. Quem se recusa a crer Nele por um acto da vontade deve sofrer a ira de Deus fora de Cristo, a nossa arca. Saber acerca de Cristo não salva uma pessoa, assim como saber acerca da arca não salvou ninguém na época de Noé. Só ao estar na arca, ao estar em Cristo, é que salva!
O caminho de Deus para a salvação não foi glamoroso. Cremos que muitos teriam entrado no Queen Mary se ele tivesse sido construído por Noé, mas não na arca. A arca era pouco chamativa aos olhos, mas era suficiente para a tarefa de salvar os homens do dilúvio. Muitas pessoas não querem ser salvas se isso não for feito de forma glamorosa, atraente e aceitável. É claro que nós não gostaríamos de passar um ano presos com animais barulhentos e a cheirar mal mais do que ninguém, mas esse era a maneira de Deus.
O Nosso Senhor Jesus, quando veio oferecer salvação aos homens, não veio como Alguém que tinha um grande magnetismo ou atracção pessoal. Como Isaías falou a Seu respeito, 700 anos antes da Sua vinda:
"Não tinha aparência nem formosura; olhamo-lo, mas nenhuma beleza havia que nos agradasse" (Isaías 53:2).
Muitos aceitariam a salvação se o seu apelo fosse carnal. Mas a salvação de Deus não é assim.
Alguns cristãos falham exactamente neste ponto. Eles acham que o caminho de Deus é glorioso do começo ao fim. Só milagres e maravilhas. Sem sofrimento, sem dor, sem agonia, sem dores de cabeça. É preciso dizer que nem sempre o caminho de Deus é tão glorioso quanto desejamos, mas só ele é o caminho da libertação, da paz e da alegria.
E a salvação proporcionada por Deus é aquela recebida pela fé na Sua Palavra revelada. Noé provavelmente nunca tinha visto uma chuva, ou mesmo ouvido o estrondo de um trovão. No entanto, Deus disse que viria um dilúvio e que ele tinha de construir uma arca. Noé creu em Deus e agiu em conformidade com a sua fé.
A fé que Noé tinha não era uma fé académica - conceitual, mas uma fé activa - uma fé prática. Ele passou 120 anos a construir aquela arca, comprometido com o Deus que ele conhecia. A nossa fé, também, precisa ser activa.
Está escrito que Noé foi um pregador. Não cremos que ele falassem com frequência por detrás de um púlpito, mas por detrás de uma tábua e de um martelo. Foi o seu modo de vida que condenou os homens da sua época e os advertiu sobre o julgamento por vir. A sua vida foi direccionada pela certeza de que o julgamento de Deus estava a chegar. Quem é cristão como nós sabe que o nosso Senhor virá outra vez para julgar o mundo. Nos ficamos a perguntar o quanto isso tem afectado o nosso dia a dia. Será que os nossos vizinhos podem dizer que estamos a viver à luz daquele dia quando haverá julgamento e salvação? Sinceramente esperamos que sim.
Noé, o Dilúvio e a Vinha
O mundo encheu-se de violência. À medida que o coração do homem se tornava cada vez pior em maldade, Deus decide trazer um grande dilúvio que terminaria com aquela geração pecaminosa e violenta. Somente Noé é achado justo e temente a Deus.
E ele recebe o mandamento divino para entrar com a sua família e animais na arca. Apenas eles sobreviveram ao dilúvio. Depois que as águas recuaram, Noé sai da arca e oferece um sacrifício. Deus então, faz uma aliança, um pacto com Noé de que não destruiria mais a Terra e a humanidade com água. Noé planta uma vinha, e bebe do vinho que produziu, ao ficar bêbado e nú. Noé é um dos mais intrigantes personagens da bíblia. E em nenhum outro lugar isto fica tão evidente como na primeira e na última vez em que o Génesis fala sobre ele. A primeira citação bíblica sobre Noé é muito promissora:
"Noé era homem justo e perfeito em suas gerações; Noé andava com Deus" Génesis 6:9.
Ninguém mais na Torah (livros da lei de Moisés), recebe especial honra, nem Abraão, nem Isaque ou Jacó, nem tão pouco Moisés ou Josué. Porém a última parte da vida de Noé, não é tão agradável de se ler:
"E começou Noé a ser lavrador da terra, e plantou uma vinha. E bebeu do vinho, e embebedou-se; e descobriu-se no meio de sua tenda" Génesis 9:20-21.

Noé Constrói uma Arca Segundo a Ordem de Deus.
O comportamento exemplar de Sem e Jafé, não esconde a situação embaraçosa que deve ter sido ver o único ser humano que foi visto como justo no meio de toda uma humanidade pecaminosa, numa situação tão degradante. Como pode um homem de alto carácter e estima espiritual, ter descido a tão baixo nível?
Esta é uma pergunta que a midrash já por um longo tempo tem procurado responder. A midrash "investigar", "estudo" é o nome dado às interpretações e aos estudos rabínicos da Torah, a lei de Moisés. Alguns a chamam de midrash halakha.
Estes estudos levam muito a sério a palavra de Deus que está além do tempo, e tem uma mensagem para cada geração nas suas diferentes épocas. Existem muitos estudos sobre Noé, mas um em particular fala sobre o seu lugar na história da fé. Quando as águas recuaram, Noé deveria ter saído da arca. Entretanto, apesar de abrir o telhado da arca e visualizar que toda a Terra estava já seca, ele fica inerte, ao aguardar o óbvio, é claro que ele tinha que sair da arca, mas não o faz, até que o próprio Deus vê a necessidade de ordená-lo a sair.
O rabino Yehudah bar Ilai (um dos maiores estudiosos da Torah do segundo século), afirma nos seus estudos: "Se fosse eu lá, eu teria quebrado a porta da arca e sairia imediatamente". Para entendermos esta história do dilúvio de Noé, devemos ler o texto cuidadosamente.
A história do dilúvio é contada muito rapidamente. Deus anuncia que a destruição da vida na Terra é algo iminente. E ordena a Noé que construisse uma arca, com medidas precisas e específicas. E detalha que Noé deve levar consigo a sua família e os animais, dois de cada espécie, ou sete em caso de espécies limpas. Começa a chover, a Terra está toda inundada. Noé e a sua família são os únicos sobreviventes. A chuva pára, as águas abaixam. Nós esperamos ler em seguida que Noé emerja, que venha para fora. Mas ao invés disso, a narrativa vai ficando vagarosa. E nos quatorze versos que se seguem, quase nada acontece.
A água retrocede, a arca repousa sobre os montes de Ararate. Noé abre uma janela e solta um corvo, depois solta uma pomba. Ele espera sete dias e volta a soltar a pomba. Ela retorna com uma folha de oliveira. Passa-se mais sete dias, ele torna a enviar a pomba pela terceira vez. Desta vez ela não retorna, mas mesmo assim Noé não põe o pé fora da arca. Então Deus tem que falar a Noé: "Sai da arca, tu com tua mulher, e teus filhos e as mulheres de teus filhos" Génesis 8:16. Só daí é que ele deixa a arca e pisa novamente em terra seca.

Somente Noé e a Sua Família Sobrevivem ao Dilúvio.
Os estudos da midrash deixam uma nota muito interessante para esse caso. Quando se trata de reconstruir um mundo devastado, como estava naquela época, nós não podemos ficar à espera por permissão, é preciso agir. Senão, vejamos: O que Noé diz para Deus, quando Ele anuncia que o mundo está prestes a perecer? O que Noé diz quando é ordenado a construir uma arca para salvar somente ele e a sua família? O que ele diz quando a chuva começa a cair? A resposta é: Nada! Durante toda a sequência de eventos, não há nenhuma linha no texto que informe que Noé tenha dito uma única palavra. Ao invés, nós lemos, por quatro vezes, sobre a sua obediência silenciosa.
E Noé representa o paradigma da obediência bíblica. Ele fez tudo estritamente como foi mandado. Mas a sua história ensina que somente obediência não é suficiente. Este é um fenómeno extraordinário, pois todos sabemos que no mundo da religião a obediência é a mais alta virtude que se pode alcançar. Mas não é no modo bíblico de pensar. Apesar do facto da Torah (os livros da lei de Moisés) conter 613 mandamentos do hebraico: mitzvot, não há nenhuma palavra que diga "obedeça".
O verbo que a Torah usa é shema /lishmoa, "ouvir, atender, entender, interiorizar, responder" que significa reflectir e depois responder ao mandamento recebido. Na bíblia, Deus não requer uma obediência cega. "Ein haKadosh Barukh Hu ba biturnya im beriyotav", "Deus não lida de forma ditatorial com as suas criaturas". Talmud da Babilónia, tratado Avodah Zarah. Deus busca mais do que uma submissão inconsequente, sem reflexão interior à sua vontade. Se não fosse assim Ele teria criado máquinas pré-programadas, robôs que responderiam automaticamente aos comandos recebidos. Deus quer que nós sejamos maduros e deliberativos. Que façamos a sua vontade porque nós a entendemos ou porque confiamos Nele, quando não entendemos. Ele busca em nós algo maior do que a simples obediência, Ele quer também a responsabilidade. Somos parceiros de Deus nesta batalha pela redenção.

As Águas do Dilúvio Destruíram o Mundo Antigo.
É por isso que intuitivamente aprendemos que o pai da fé não é Noé, e sim Abraão. Abraão, que lutou uma guerra para resgatar o seu sobrinho, que orou pelo povo da terra mesmo quando sabia que eles eram pecadores. Abraão que "questionou" os céus, quando do seu encontro com Deus:
Vamos imaginar o que não teria dito Abraão quando confrontado com a notícia de que o mundo seria destruído pelo dilúvio. "E se porventura houver cinquenta justos na cidade? Ora, não se ire o Senhor, que ainda só mais esta vez falo: Se porventura se acharem ali dez?"
Talvez, quem sabe, Abraão poderia ter salvo o mundo antigo. Claro, ninguém pode afirmar com certeza, mas a oração de um único justo pode muito em seus efeitos! Muitas pessoas estão assim como Noé, a aguardar, a aguardar uma ordem para fazer o bem. Quantas pessoas não afirmam que estão à espera de uma confirmação de Deus para fazerem a Sua vontade. Para fazer o bem ou ajudar o próximo, não há necessidade de confirmação. A vontade de Deus é óbvia e clara.
Quando Moisés demorou a descer do monte Sinai, onde recebeu as tábuas da lei de Deus, o Bnei Yisra'el, (o povo de Israel) fez para si um bezerro de ouro e o adorou. A ira de Deus acendeu-se de tal forma que Ele planeava consumir o Bnei Yisra'el e fazer de somente Moisés (o único que sobreviveria) uma grande nação. Pelo que Moisés, diferentemente de Noé, não obedeceu imediatamente ao comando divino, antes intercedeu, orou e clamou pelo povo. E os planos divinos foram modificados, por causa da intercessão de Moisés - Moshê.
É preciso ir além da obediência. Precisamos de ser intercessores, somos chamados uma nação de sacerdotes e profetas. Noé salvou somente ele mesmo e a sua família. E Noé termina bêbado, nú, ao causar constrangimento para os seus filhos. O que nos traz uma mensagem de que se nos salvarmos somente a nós mesmos, e não fizermos nada para salvar os outros, nem a nós mesmos conseguiremos salvar.
"Portanto ide, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo;" Mateus 28:19
"Moisés, porém, suplicou ao Senhor seu Deus... Lembra-te de Abraão, de Isaque, e de Israel, os teus servos, aos quais por ti mesmo tens jurado,... Então o Senhor arrependeu-se do mal que dissera que havia de fazer ao seu povo" Êxodo 32:11-14.
"Agora, pois, deixa-me, para que o meu furor se acenda contra ele, e o consuma; e eu farei de ti uma grande nação" Êxodo 32:10.
"Então disse o Senhor a Moisés: Vai, desce; porque o teu povo, que fizeste subir do Egipto, se tem corrompido," Êxodo 32:7.
"Mas o fruto do Espírito é: amor, gozo, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fé, mansidão, temperança. Contra estas coisas não há lei" Gálatas 5:22-23
"Longe de ti que faças tal coisa, que mates o justo com o ímpio; que o justo seja como o ímpio, longe de ti. Não faria justiça o Juiz de toda a terra?" Génesis 18:25
"E chegou-se Abraão, dizendo: Destruirás também o justo com o ímpio?" Génesis 18:23
"E fez Noé conforme a tudo o que o Senhor lhe ordenara" Génesis 7:5
"Assim fez Noé; conforme a tudo o que Deus lhe mandou, assim o fez" Génesis 6:22
"E viu Cão, o pai de Canaã, a nudez do seu pai, e fê-lo saber a ambos seus irmãos do lado de fora. Então tomaram Sem e Jafé uma capa, e puseram-na sobre ambos os seus ombros, e indo virados para trás, cobriram a nudez do seu pai, e os seus rostos estavam virados, de maneira que não viram a nudez do seu pai" Génesis 9:22-23.
Não podemos afirmar como doutrina, mas a narrativa parece querer dizer que Noé não conseguiu viver livre da culpa de ser o único sobrevivente do dilúvio, sem ter ao menos feito uma tentativa apenas para salvar as demais pessoas. Não se espera por autorização para reconstruir vidas. É necessário correr riscos e andar à frente. Fé é mais do que obediência, é coragem para fazer.
Estudo de Génesis 6
Génesis 6:1 - 8:22 O dilúvio
Génesis 6:1-7, 11-13 A causa do dilúvio
A genealogia de Génesis 5 deixa claro que, além dos descendentes de Adão e Eva citados por nome, cada um desses homens "teve filhos e filhas". Caim também teve filhos e filhas que, por sua vez, tiveram as suas próprias famílias. Assim, no tempo de Noé, a décima geração depois de Adão, a população havia crescido consideravelmente, como indica o início de Génesis 6: "como se foram multiplicando os homens na terra" (Génesis 6:1).
O ideal de Deus para a família já havia sofrido dois golpes, pois o relacionamento entre marido e mulher não era mais inteiramente aberto, como se percebe na necessidade de esconderem um do outro algumas partes do corpo (Génesis 3:7), nem monogâmico (Génesis 4:19). Aqui, essa relação sofreu um terceiro golpe que a distorceu ainda mais, pois os filhos de Deus se casaram com as filhas dos homens (Génesis 6:2). Num casamento desse tipo, o marido e a mulher não estão mais a viver no temor do Senhor. Entraram numa aliança entre a luz e as trevas, entre o sagrado e o profano (2Coríntios 6:14). Deus havia advertido que a consequência do pecado era a morte (Génesis 2:17) e, diante dessa perversidade crescente, ele determina que essa morte ocorrerá ainda mais cedo, ao reduzir o limite da vida humana a cento e vinte anos (Génesis 6:3). No entanto, é possível que essa determinação tenha sido um acto de misericórdia, pois é difícil viver anos a fio sem a paz de Deus no coração. Fica claro que esses casamentos mistos desagradaram ao Senhor. No entanto, não há um consenso entre os estudiosos quanto à identidade das partes envolvidas. Alguns argumentam que os "filhos de Deus" eram anjos caídos, possivelmente os mesmos que, segundo Judas, "abandonaram o seu próprio domicilio", ou seja, o seu estado (Judas 6). Nesse caso, as mulheres foram consideradas tão perversas que se dispõem a casar com qualquer um, até mesmo com um anjo caído. Os anjos tomaram para si [...] as que mais lhe agradavam. Aqueles que defendem esse ponto de vista argumentam que os gigantes (Números 13:33) de Génesis 6:4 nasceram dessas uniões mistas. No entanto, a linguagem usada não parece exigir essa interpretação, pois o texto parece dizer apenas que os gigantes existiam no tempo em que estavam a ocorrer essas uniões mistas. A referência a eles pode ser simplesmente uma indicação de que, além de abençoar a humanidade com uma vida longa e crescimento numérico, Deus também havia lhes concedido uma grande estatura.
Uma possibilidade mais provável e que o texto esteja a referir-se a casamentos mistos entre homens da linhagem de Sete (chamados de "filhos de Deus" pelo facto de Sete, o seu antepassado, ser temente a Deus) e mulheres da linhagem de Caim (chamadas de "filhas dos homens" pelo facto de Caim ter sido expulso da presença do Senhor e seguido a sua própria vontade, como fizeram os seus descendentes como Lameque). Nesse caso, a linhagem de Sete, que devia promover a vontade de Deus, havia perdido o foco a tal ponto que tudo o que importava era a beleza das mulheres da linhagem de Caim. Embora apresente algumas imperfeições, essa hipótese tem o mérito de enfatizar a diferença entre as linhagens de Caim e Sete: ao que parece, a tradição de Enos de invocar o nome do Senhor (Génesis 4:26) começa a desaparecer. Deus se desagrada quando todos se tornam perversos e não é mais possível fazer distinção entre as pessoas com base nos seus valores.
As palavras era continuamente mau todo o desígnio do seu coração (Génesis 6:5) mostram os crescentes avanços do mal entre os seres humanos. O autor também diz que a humanidade estava corrompida e cheia de violência (Génesis 6:11-12). Infelizmente, estas palavras se aplicam muito bem às nossas sociedades do século XXI. Assim, devemos atentar para a atitude do Senhor diante dessas condições: resolvi dar cabo de toda carne [...] eis que os farei perecer juntamente com a terra (Génesis 6:13). Deus não fez isso com alegria ou ira insensível. Pelo contrário, este é um dos versículos mais comoventes das Escrituras, pois nos diz que Deus tomou essa atitude com tristeza: e isso lhe pesou no coração (Génesis 6:6). Os filhos que causam esse tipo de dissabor ao pai são amaldiçoados, quer a maldição seja pronunciada, quer não. O Deus entristecido aborrece o mal e age de modo a tratar dele. Será que o coração de Deus está entristecido e pesado por causa da nossa corrupção e perversidade? Nesse caso, estamos sob a maldição do Deus que concede e sustenta a vida! Isso não significa que é impossível escapar dessa maldição. Deus é um Pai amoroso que deu o seu Filho Jesus Cristo para nos resgatar (Gálatas 3:13). No entanto, também é um Deus de justiça e rectidão (Miquéias 6:8), e é nossa responsabilidade corrigir aquilo que está errado.
O restante da criação não participou do pecado humano, mas, ainda assim, foi contaminado pelo contacto com os seres humanos e destruído junto com eles (Génesis 6:7). O pecado é como o fermento que permeia todo o pão. O homem que, em tempos idos, era a coroa da criação com a sua beleza e vida em comunidade (Génesis 1:31), arruinou tudo o que Deus havia criado. De acordo com o principio aplicado a esse caso, o comportamento do chefe da família afecta não apenas a ele próprio, mas a toda a sua casa. Vimos a aplicação desse principio em relação a pais e filhos (Caim e Lameque - Génesis 3:19-24), e vemos como continua válido tanto para chefes de estados e instituições como para a relação entre os seres humanos e a natureza.
Génesis 6:8-10, 14-18 Uma excepção
Apesar de o mundo ter se afundado em pecado, houve alguém que achou graça diante do Senhor (Génesis 6:8). Esse individuo é descrito como um homem justo e integro entre os seus contemporâneos, um homem que andava com Deus (Génesis 6:9). Muitos cristãos africanos se perguntam se é possível prosperar ao ser honesto nos negócios, se podemos nadar contra a maré e, ainda assim, ser bem-sucedidos. Noé nos dá a resposta. Ele encontrou favor diante de Deus. O mesmo acontecerá com qualquer um que glorificar a Deus na sua geração, por mais que o mal tenha se tomado parte da nossa sociedade. Deus revelou os seus planos a esse homem extraordinário (Génesis 6:13) e deu-lhe instruções específicas. A princípio, Noé recebeu uma ordem geral, Faze uma arca (Génesis 6:14), e só depois recebeu os detalhes sobre a construção (Génesis 6:15-16). Noé precisava, primeiro, decidir obedecer à instrução geral de Deus; só então os detalhes seriam relevantes. Deus opera da mesma forma hoje ao nos dar a instrução geral "Crê no Senhor Jesus" (Actos 16:31; João 3:16, 36), que deve ser obedecida antes de qualquer facto específico. É inútil discutir questões académico-teológicas sobre Jesus antes de obedecer à instrução inicial de crer nele. De nada serve, no plano divino da redenção, o conhecimento de minúcias bíblicas ou teológicas sem disposição para a obediência.
A arca seria construída de tábuas de cipreste, teria compartimentos e seria revestida por dentro e por fora com betume para impermeabilização (Génesis 6:14). Teria trezentos côvados (140 m) de comprimento, cinquenta côvados (23 m) de largura e trinta côvados (13,5 m) de altura (Génesis 6:15). A arca teria uma porta lateral e seria coberta, mas Noé deveria deixar uma abertura de um côvado de altura entre as paredes e a cobertura para permitir a circulação do ar (Génesis 6:16). Por dentro, a embarcação teria três pavimentos. As instruções de Deus foram específicas porque só ele estava a par de detalhes como a intensidade e a duração do dilúvio, quem seriam os ocupantes da arca e assim por diante. É facto comprovado que uma arca com essas medidas poderia boiar.
Em Génesis 6:13, o Senhor revelou a Noé que destruiria toda a humanidade e em Génesis 6:17 explicou de que maneira isso ocorreria. Essa explicação deve ter ajudado Noé a entender por que era necessário construir a arca. A declaração do Senhor tudo o que há na terra perecerá deve ter sido profundamente perturbadora, mas, assim como Noé não a questionou, não nos cabe questioná-la. Como Criador, Deus tem o direito de destruir a sua criação. No entanto, também há esperança, pois Deus prometeu a Noé: Contigo, porém, estabelecerei a minha aliança; entrarás na arca, tu e teus filhos, e tua mulher, e as mulheres de teus filhos (Génesis 6:18). Deus não se compraz na destruição injustificada.
Ele destruiu a Terra porque ela não estava mais a cumprir o propósito para o qual ele a havia criado. O propósito da humanidade e da criação era declarar o "eterno poder [de Deus], como também a sua própria divindade" (Romanos 1:20), e a sua santidade (Salmos 19:1; 29:2; Isaías 43:7; 51:7). Quando os seres humanos frustram essa intenção em vez de promovê-la, o Criador - como os inventores do nosso tempo - tem todo o direito moral de começar da estaca zero. Aqueles que preservam a justiça de Deus, como fez Noé, encontram segurança. O Senhor firma uma aliança com aqueles que procedem desse modo, mas destrói o restante. Assim, ao pregarmos, jamais devemos enfatizar a graça de Deus à custa da sua justiça. É preciso manter o equilíbrio entre o seu amor e a sua santidade, pois ele preserva ambos. Juntamente com Noé foram salvos a sua esposa, os três filhos e as respectivas esposas (Génesis 6:18; 7:13). Podemos argumentar que eles foram salvos porque as bênçãos de Noé se estenderam a toda a sua casa. Também é possível que o relacionamento de Noé com Deus tenha influenciado os seus familiares a ponto de qualificar todos os membros da sua casa para entrar na arca. Ao considerar-se o contexto geral da passagem, a primeira explicação parece mais provável. Este princípio de comunidade sem dúvida é aplicado em situações semelhantes, como quando Ló recebeu a ordem de reunir os seus familiares e sair de Sodoma (Génesis 19:12). Mais uma vez, somos lembrados da importância do relacionamento entre o chefe da família e Deus, pois a conduta desse homem ou mulher pode resultar num transbordamento de bênçãos ou maldições para o restante da família.
Génesis 6:19 - 7:5 - O objectivo do dilúvio
Apesar da destruição de tudo o que não estava na arca (Génesis 7:21-23), o objectivo maior do dilúvio não era eliminar toda a vida, mas sim acabar com o fundamento do pecado. Pode-se dizer que o dilúvio não visava aniquilar a criação, mas preservá-la por intermédio de tudo o que Deus havia ordenado a Noé colocar na arca para permanecer seguro. A destruição de toda a criação teria representado um fracasso do Criador, mas o Senhor não falha em nenhum dos seus propósitos. Nem mesmo o pecado inicial de Adão e Eva frustrou os seus planos, pois ele anunciou na mesma ocasião a vinda futura do Salvador que esmagaria o diabo e daria inicio a uma nova comunidade que celebraria a glória de Deus (Génesis 3:15). Assim, ao anunciar que destruiria "toda carne em que há fôlego de vida" (Génesis 6:17), Deus não estava a fazer uma declaração literal. Além de não destruir Noé e a sua família, ele também poupou representantes de todas as espécies de animais para que a vida pudesse ter continuidade. Ele havia descansado da obra da criação (Génesis 2:2), e nem mesmo a destruição do mundo o faria retomá-la. Assim, Deus instruiu Noé a colocar dentro da arca um macho e uma fêmea de cada espécie de ave e animal (Génesis 6:19-20), ao prover com isso tanto o extermínio quanto a continuidade. Uma geração é eliminada, mas um remanescente sobrevive para iniciar uma nova geração.